Antes de sair, Weintraub extinguiu cotas para negros e indígenas na pós-graduação

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, revogou antes de sua saída uma portaria de 2016 que determinava cotas  para negros, pardos, indígenas e pessoas com deficiência em cursos de pós-graduação nas universidades e institutos federais, o que inclui programas de mestrado e doutorado. Esta foi a chamada cachada final, sua última medida como ministro.

A portaria de maio de 2016, assinada pelo então ministro da Educação do governo de Dilma Rousseff, Aloizio Mercadante, determinou que as instituições adotassem esses programas para ampliar a “diversidade étnica e cultural” no corpo discente.

A revogação, porém, tem efeito mais político do que prático, já que ela não elimina a reserva de vagas em pós-graduações que adotaram cotas nem impede que sejam adotadas a partir de agora, já que as instituições têm autonomia para criar suas próprias regras.

Ministro Abraham Weintraub ao deixar o prédio do ministério

O texto pedi a criação de grupos para promover e aperfeiçoar as propostas. “As Instituições Federais de Ensino deverão criar comissões próprias com a finalidade de dar continuidade ao processo de discussão e aperfeiçoamento das ações afirmativas”, ressalta.

Publicada no Diário Oficial da União, a revogação impacta diretamente no acesso de negros e indígenas ao mestrado, mestrado profissional e doutorado. Curiosamente Weintraub não justificou sua decisão.

Apenas para recordar, na reunião ministerial 22 de abril, o ministro chegou a dizer que odeia o termo “povos indígenas”. “Odeio o partido comunista [trecho cortado] querendo transformar a gente numa colônia. Odeio o termo povos indígenas, odeio esse termo, odeio. Ou povos ciganos. Só tem um povo nesse país […] é povo brasileiro […] acabar com esse negócio de povos e privilégios”, declarou.

Na mesma linha de raciocínio, O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) também já se posicionou contra as cotas raciais.

Em nota, o MEC disse que a revogação da portaria ocorreu com base em um decreto de 2019 sobre a revisão e a consolidação dos atos normativos. Destaca também que a Lei de Cotas prevê ações afirmativas exclusivamente para cursos de graduação.

Durante a vigência da portaria anulada por Weintraub, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) coordenava a elaboração periódica do censo discente da pós-graduação brasileira, com o intuito de fornecer os subsídios para o acompanhamento de ações de inclusão de negros, indígenas e pessoas com deficiência na pós-graduação.

A medida do ministro da Educação contraria, por exemplo, entendimentos do Supremo Tribunal Federal (STF) que declarou, em 2012, a Constitucionalidade das Políticas de Ações Afirmativas. A Lei nº 12.990, de junho de 2014, reservou 20% das vagas aos negros no serviço público federal. A legislação cita que as “ações afirmativas na graduação não são suficientes para reparar ou compensar efetivamente as desigualdades sociais resultantes de passivos históricos ou atitudes discriminatórias atuais”.

Desigualdade

A mais recente pesquisa sobre o assunto, divulgada em 2015, mostra que o número de estudantes negros (soma de pretos e pardos) no mestrado e no doutorado mais que duplicou de 2001 a 2013, passando de 48,5 mil para 112 mil, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Considerando apenas os estudantes pretos, o número passou de 6 mil para 18,8 mil, um aumento de mais de três vezes.

Embora representem a maior parte da população (52,9%), os estudantes negros são apenas 28,9% do total de pós-graduandos. O número de estudantes brancos nessa etapa de ensino também aumentou nos últimos 12 anos, passando de 218,8 mil para 270,6 mil.

Congresso

Na Câmara e no Senado, congressistas protocolaram projetos para tentar tornar sem efeito a revogação assinada por Weintraub. A deputada Tabata Amaral (PDT-SP) foi uma delas. Afirmou, em seu perfil do Twitter, que “as cotas, para além de promover justiça social, têm resultados acadêmicos comprovados” e que não serão permitidos retrocessos. A liderança do Cidadania no Senado também apresentou projeto com a mesma intenção.

Repercussão negativa e manifestos

A reação não poderia ser diferente e, acabou gerando manifestações em diversas universidades do país. Em Marília não foi diferente e profissionais tradutores e intérpretes de língua brasileira de sinais entraram em contato com a redação do JORNAL DO ÔNIBUS de MARÍLIA para registrarem de foram pacífica o manifesto de desagravo e repúdio contra a medida. Leia com exclusividade e na íntegra o teor do documento elaborado pela equipe;

A Assembleia dos Profissionais Tradutores Intérpretes de Língua Brasileira de Sinais – Libras lotados na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Câmpus de Marília é um órgão colegiado, composto por todos os profissionais intérpretes de Libras no câmpus, cujas competências são tratar das diversas formas de acessibilidade às pessoas surdas, sendo elas graduandos, pós graduandos, docentes, técnicos ou cientistas, elaborar planos de acessibilidade quanto a materiais e romper quaisquer barreiras acadêmicas às pessoas surdas, bem como deliberar sobre as questões profissionais dos Tils, seus direitos trabalhistas e direito da Comunidade Surda e do Povo Surdo. Abraham Weintraub, ex-Ministro da Educação, durante 14 meses à frente da pasta prestou um desserviço à Educação Pública brasileira, culminando na portaria 545 do MEC, em seu último ato como ministro, retirando o direito às cotas nos cursos de pós graduação a discentes negros, indígenas e pessoas com deficiência. Weintraub ignora o direito das minorias e vem em contrapartida às diversas medidas adotadas nos últimos anos, as quais fizeram com que no ano de 2019, pela primeira vez na História da Educação Brasileira, estudantes negros fossem maioria dos acadêmicos em Universidades Públicas, assumindo 50,3% das vagas. Nos últimos cinco anos a Unesp – Câmpus de Marília teve em seu quadro de discentes seis alunos surdos nos cursos de graduação da instituição e um discente surdo na pós graduação. A luta pelo direito ao acesso e permanência desses estudantes não pode ser desmerecida por uma medida autoritária do ex-ministro da Educação. Dessa forma, REPUDIAMOS a portaria 545 do MEC ressaltando sua ilegalidade e inconstitucionalidade e nos colocamos em comunhão com os diversos órgãos, colegiados e coletivos de pessoas com deficiência, índios e negros pela luta da igualdade social e racial em nosso país. A luta é de todos. Desejamos uma Educação Pública e de qualidade a todos os cidadãos brasileiros.

Jéssica Roberta da Silva Corrêa João Henrique Bonini do Nascimento Julía Carolina Martins Pereira Maria Luisa de Castro Santos Marcelo Henrique Faustino Candiotta

Tradutores Intérpretes de Libras da Unesp/Câmpus de Marília

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