Prefeitura de Marília não desenvolveu nenhum projeto específico para os menos favorecidos, apenas distribuição de cestas básicas.

A verdade é uma só ; O coronavírus também está nas favelas, comunidades e periferias da cidade de Marília. A dúvida não é mais se, mas quantos serão infectados, quantos conseguirão acesso ao SUS, quantos morrerão nos hospitais e quantos morrerão sem atendimento. É uma hipocrisia muito grande em meio a mais de 13 mil infectados não haver nenhum residente em área de risco.

A realidade de Marília segue o cenário de muitos grandes centros, mas, por ser uma cidade menor e com cerca de pelo menos 10 comunidades identificadas oficialmente como área de risco, a situação poderia estar sendo melhor conduzida com uma força tarefa comandada pelo gestor municipal com a participação de boa parte das secretarias, clubes de serviço, igrejas, entidades comunitárias, ONG’s e outros, mas, infelizmente faltou sensibilidade, cristandade e iniciativa própria.

Com um pouquinho de boa vontade, é possível encontrar belos exemplos em muitas comunidades neste Brasil afora, onde a solidariedade falou mais alto, e foi muito mais além do que distribuição de mini cestas básicas. Logo no inicio da pandemia, em meados de março do ano passado, a coluna Painel, da Folha, destacava uma iniciativa ocorrida em uma das maiores favelas da capital paulista e, que pegamos como exemplo.

Na oportunidade a coluna destacava que “em Paraisópolis, na zona sul de SP, onde moram 100 mil pessoas, 420 voluntários cuidaram de 50 casas cada um, e foram conhecidos como os “presidentes das ruas”. O modelo foi replicado em favelas como Heliópolis, em SP, Rocinha e Alemão, no RJ.

Eles eram responsáveis por monitorar as pessoas em suas casas, passar instruções de higiene e entregar mantimentos até lá levados em carros com sirenes que soavam para avisar o momento da recepção e da distribuição de alimentos.

Outra iniciativa também defendida pelo JORNAL DO ÔNIBUS DE MARILIA foi feita com sucesso, ou seja; uma higienização de todas as ruas de Paraisópolis com auxílio de drones, tratores e também com trabalho manual. “Nós conseguimos fazer essa iniciativa, mas quem deveria fazer isso era o prefeito, que nem sequer ultimamente tem dito a palavra ‘favela’. É como se a gente não existisse”, afirmou um lider comunitário.

A realidade de lá, não é diferente daqui, onde, no contra ponto, poderiam trabalhar de forma integrada a secretaria da saúde entrando com o atendimento a doentes e acamados, médicos, e uma farmácia ambulante contendo as medicações mais utilizadas de forma preventiva ao vírus maldito. Na retaguarda, secretaria de assistência social e de direitos humanos e secretaria de planejamento urbano.

Enfim, uma força tarefa independente de partido, mas, com mais coração e senso humanitário. Infelizmente em Marília, sequer temos a divulgação do censo de casos de contaminados por região da cidade e consequentemente nenhum dado sobre como está a situação desta população residente em áreas de risco. Qual será a realidade dessa população que só é lembrada em período eleitoral ???

É importante lembrar que o Serviço Geológico do Brasil mapeou em Marília entre 2016 e 2019 áreas em alto e muito alto risco a movimentos de massa, deslizamentos, enchentes e outros fenômenos naturais. O levantamento foi feito por meio de imagens de satélites e trabalho de campo, “fartamente ilustrado com fotografias”, segundo consta em uma ação do Ministério Público Estadual e que notificou a administração municipal cobrando providências.

Pelo estudo, são residências que estão “em zonas de ruptura do relevo, os conhecidos itambés, sem fundações seguras ou suficientes”, segundo consta na ação movida pelo Ministério Público Estadual de São Paulo (MP-SP). O relatório denuncia falta de “captação e drenagem das águas pluviais, ocupações de encosta com declividade elevada, construções nas cristas das escarpas do itambés, casas construídas em região de drenagem, com surgência de águas subterrâneas”.

A gravidade das circunstâncias foi identificada pelo Serviço Geológico do Brasil, vinculado ao Ministério das Minas e Energia, a pedido do Ministério das Cidades. Argolo Ferrão, Eldorado, Bandeirantes, Vila Real, Nova Marília, Homero Zaninoto, Fragata, Santa Antonieta, Linhão, Parque das Nações, Jânio Quadros e Vila Barros, são os bairros em que o Judiciário afirma a existência de “situação de risco a que estão expostas muitas pessoas”.

Para se ter ideia, em janeiro de 2018, o MP-SP fez recomendações para que a Prefeitura tomasse atitudes com o objetivo de proteger a população em risco, no que diz respeito a remoção emergencial das famílias que nelas porventura habitarem, utilizando-se, da construção de novos conjuntos habitacionais ou da implantação do aluguel social para que possam ser alojadas as famílias. Até o momento, ouve apenas distribuição de cestas básicas.

Se não houve nenhuma ação no que diz respeito a segurança habitacional, não era de se esperar alguma mobilização no combate ao coronavírus para esta população de forma especifica. A classe média das grandes cidades tem plenas condições de se isolar e suportar a quarentena se abastecendo pela internet e serviços de entrega. Quem não pode, se verá diante de uma crise de saúde e uma crise econômica, onde uma se soma à outra, e, quem não vê isto, podem ter a certeza, está se omitindo.

Em forma de desabafo adaptamos um texto de Magnoli para a nossa realidade, que diz: “Nós, esclarecidos, vivemos na bolha da alta classe média (…) Com que direito moral apontamos o modelo de ‘lockdown‘ absoluto como solução para cortar a transmissão do vírus em Marília ? Na Vila Barros, no Argolo, no Bandeirantes ou no Azaléia, onde as pessoas residem em habitações de 20 metros quadrados que abrigam cinco ou seis indivíduos?

O Brasil não é os EUA. Aqui, o governo não postará cheques periódicos de mil dólares para cada família durante o intervalo imensurável da ‘guerra’. Vamos parar os transportes públicos e decretar, universalmente, o trabalho à distância? Como ficam motoristas, comerciários, garçons, pedreiros, as massas de informais? (…) E o pior de tudo…como ficam os que não possuem um trabalho, e sequer uma oportunidade ?

Não declaremos uma guerra cujas vítimas serão os outros – os sem patrimônio, cartão de crédito e investimentos financeiros. Eles moram lá nas ruas e vielas de uma favela qualquer, esquecida pelo poder público que neste momento poderia em muito fazer a diferença e ser exemplo para o país. ”

Em nosso humilde ponto de vista, de um simples jornalista provisionado e morador na periferia que testemunha o dia a dia desse povo que levanta de madrugada para enfrentar fila nos postos de saúde, o momento não é para se discutir a construção de um novo prédio para a Câmara Municipal, mas sim, de se construir projetos para enfrentarmos estas crises e auxiliarmos os menos favorecidos pela sorte. Marília não é Dubai para se gastar uma fortuna de R$ 200 mil por mês no aluguel de um prédio.

Se essa quantia fosse aplicada mensalmente no desenvolvimento de programas de geração de emprego e renda, habitação social e programas de sustentabilidade, com certeza, e um futuro bem próximo teríamos três problemas graves amenizados em uma só ação; a violência, a fome e a dignidade para estas pessoas.

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