Segundo estudo, ônibus, trens e metrôs teriam que injetar quase 2,5 vezes a mais de ar novo por segundo para evitar contaminações

O transporte público brasileiro é o ‘grande vilão’ para a disseminação da variante Ômicron da Covid-19, segundo um estudo realizado pela Sociedade Brasileira de Controle de Contaminação (SBCC).

A análise mostra que a taxa de renovação de ar no interior de ônibus, trens e metrôs é insuficiente para a eliminação eficiente das gotículas contaminadas pelo vírus.

“A contaminação no transporte público acontece pelo ar, mesmo com as pessoas utilizando máscara. Não há renovação de ar principalmente nos veículos com ar-condicionado, o que torna muito grande a chance de contágio pela Covid-19”, disse o diretor do SBCC e especialista em climatização e refrigeração, Ricardo Salles.

“A solução é simples, mas existe um conflito de interesse. O que precisamos fazer é abrir a renovação de ar desses veículos. Financeiramente isso não é inteligente para as empresas, porque se gasta muito mais combustível e não é lucrativo. Mas na prática é fundamental para mitigar as contaminações dentro desses transportes”, completou.

O estudo exemplifica que um ônibus, que comporta 45 passageiros sentados e 50 em pé, deve injetar no interior do veículo aproximadamente 243 litros de ar novo a cada segundo para evitar contaminação.

No entanto, na prática, o valor é muito inferior: 100 litros por segundo dentro desses veículos.

Pesquisadores e especialistas ouvidos no domingo (30) dizem que os transportes públicos do Brasil são grandes focos de transmissão da covid-19.

O professor da Faculdade de Estatística da Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói e pós-doutor em Epidemiologia, Márcio Watanabe, destaca que os veículos coletivos apresentam todos os ‘ingredientes’ necessários para uma grande disseminação de Covid-19. Ele faz uma comparação entre o transporte público e os restaurantes.

“Certamente o transporte público é um grande meio de contaminação. As janelas da maioria dos ônibus hoje em dia não abrem e ao menos nos grandes centros urbanos vemos enorme aglomerações dentro de ônibus, metrôs e trens”, diz.

“Ou seja, todos os ingredientes para grande disseminação de vírus de transmissão respiratória como o Sars-Cov2. A chance de se contaminar aumenta com a má circulação do ar e com a densidade de pessoas no local. O ônibus e o metrô lotados têm uma densidade de pessoas que passa de 10 vezes ou mais do que em um restaurante cheio”, explicou.

Já o infectologista e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Celso Ferreira Ramos, destacou ainda que o uso de máscara no interior dos veículos é necessário, porém não suficiente.

“Sempre teremos maior contaminação onde for possível observar uma grande aglomeração de pessoas. Por exemplo, apesar de hospitais apresentarem uma taxa elevada de vírus, existe uma quantidade maior de pessoas circulando em transporte público do que propriamente nas unidades de saúde. Isso torna os ônibus um lugar de grande periculosidade”, afirmou.

“Por fim, apesar de obrigatório, essas pessoas no transporte não estão necessariamente utilizando máscaras. E esses equipamentos de proteção também são importantes barreiras. Qualquer máscara tem limites de proteção. Ela reduz muito a entrada de agentes infecciosos”, explicou Celso Ramos.

O especialista em saúde pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Raphael Guimarães, esclarece que o transporte público nacional precisa ter as frotas expandidas, com o intuito de evitar possíveis aglomerações.

Ele também sugere uma flexibilização das empresas, para que o fluxo de pessoas se disperse durante o dia.

“O transporte público é um grande foco de aglomeração, especialmente nos horários de pico. É possível pensar alternativas que protejam um pouco mais as pessoas. Talvez ter uma frota aumentada apenas nos horários de pico. Haver uma organização no fluxo das empresas, tornar o acesso aos horários de circulação de ônibus, trens e metrôs acessível a todos. Assim as pessoas poderiam organizar chegadas e saídas sem precisar se aglomerar”, ressaltou Guimarães.

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