Dia da Consciência Negra, anualmente celebrado no 20 de novembro, faz referência à data da morte de Zumbi dos Palmares – ocorrida em 1695, após a traição de um ex-companheiro de luta contra a escravização.

Do ponto de vista do Estado, o Dia da Consciência Negra foi inserido no calendário escolar em 2003. Em 2011, foi reconhecido legal no âmbito federal. Ainda assim, o caráter de feriado depende das leis locais. Antes do reconhecimento, a data passou por um longo percurso. Há exato meio século – ou seja, em 1971 – ocorreu a primeira celebração contemporânea do 20 de Novembro.

A ideia de se utilizar o dia da morte de Zumbi dos Palmares para rememorar o legado da escravização e do racismo na formação do Brasil, bem como da resistência de negros e negras, está intimamente ligado ao Grupo Palmares, do Rio Grande do Sul.

Fundado em julho de 1971, o Grupo funcionou até 1978. Em 20 de agosto daquele ano, lembraram os 89 anos da morte do abolicionista Luiz Gama. Em 20 de novembro, realizariam o primeiro “Dia do Negro” em plena ditadura militar, a partir de uma sugestão de Oliveira Silveira, um dos principais integrantes e intelectuais do Grupo.

A importância de Silveira seria reconhecida em 2011, quando a Biblioteca da Fundação Palmares, ligada ao Governo Federal, foi nomeada em sua homenagem. Já sob o governo Bolsonaro, a direção do órgão tenta modificar o nome do acervo da Fundação. A primeira celebração do 20 de Novembro ocorreu no Clube Social Negro “Marcílio Dias”, fundado em 1949 em Porto Alegre.

O clima repressivo da ditadura era tal que o Grupo Palmares precisou explicar às autoridades que não tinha ligação com a Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares), grupo de resistência armada ao regime militar. A iniciativa do Grupo Palmares se expandiria pelo país principalmente a partir de 1978, quando é fundado o Movimento Negro Unificado (MNU), em São Paulo.

O MNU surge tendo como um de seus objetivos articular diversas organizações locais já existentes – como o Grupo Palmares – e expandir o movimento negro pelo país. Fundado em julho de 78, o Movimento Negro Unificado decidiria em 4 de novembro daquele mesmo ano definir duas datas para a luta antirracista no Brasil.

A primeira delas seria o tradicional 13 de Maio, dia da Abolição. Por entender que o processo de extinção formal e legal da escravização não incluiu o negro e a negra na sociedade brasileira, o MNU passou a chamar a data de Dia Nacional de Denúncia Contra o Racismo. O 20 de novembro, nos debates e na decisão do MNU em 1978, passaria a ser chamado de Dia Nacional da Consciência Negra.

INTERPRETAÇÃO CORRETA : Liberdade conquistada, não concedida

Um dia da consciência negra e ampla - Notícias - TJPR

Voltando ao princípio do legado gaúcho de forma mais detalhada, entre os jovens que se reuniram em Porto Alegre estavam Antônio Carlos Côrtes, Oliveira Silveira, Ilmo da Silva, Vilmar Nunes, Jorge Antônio dos Santos (Jorge Xangô) e Luiz Paulo Assis Santos. Juntos, eles formaram o Grupo Palmares, uma associação que realizava estudos sobre a história e a cultura negra. Foi em uma reunião na casa dos pais de Côrtes que escolheram o nome em alusão ao quilombo que resistiu por quase cem anos.

Para os gaúchos, já passava da hora de romper com a ideia de liberdade concedida, substituindo-a por uma concepção de liberdade conquistada. O advogado, Antônio Carlos Côrtes, hoje com 72 anos, destaca que a Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel (1846-1921) no dia 13 de maio de 1888, foi uma “abolição incompleta”, pois não garantiu assistência ou apoio governamental para o acesso a terras, educação e trabalho a mulheres e homens antes escravizados. 

Sem apoio do Estado para a inserção dos ex-escravizados na sociedade e diante das mazelas que seguiram afligindo o povo negro, o Grupo Palmares decidiu dizer “não ao 13 de maio” e buscou por meio de estudos uma nova data que simbolizasse a luta negra. Foi assim que descobriu a data da morte de Zumbi dos Palmares (1655-1695), líder do Quilombo dos Palmares, localizado na Serra da Barriga, em Alagoas. O quilombo foi o maior reduto de resistência à escravidão do período colonial.

Como já citamos, o Dia da Consciência Negra ganhou visibilidade pela primeira vez em 1971, quando o grupo pioneiro realizou um ato evocativo à resistência negra na noite do dia 20 de novembro no clube Marcílio Dias, em Porto Alegre. O evento valorizava “o herói Zumbi dos Palmares”.

Além de um contraponto à data “oficial”, a escolha do 20 de novembro também representou uma forma de valorizar a cultura, a história e o papel político dos afro-brasileiros na sociedade. Esses elementos, aponta o pesquisador, vão balizar não só essa identidade, mas as ações do movimento negro a partir de então.

Morte de Zumbi

— Toda a luta antirracista está baseada nessa identidade com referencialidade negra, afro-brasileira, uma coisa que antes do 20 de novembro era impensável. A partir daquele momento, as pessoas negras mais engajadas se deram conta de que deveriam negociar a sua integração plena na sociedade brasileira a partir de outro lugar, não mais a partir do branqueamento social, mas de uma identidade negra, uma nova forma de negociar a cidadania. A semente foi plantada pelo Grupo Palmares. 

Representatividade

Se a batalha para consolidar uma data de reflexão e resistência negra no calendário nacional é resultado de um processo de mais de 50 anos, a luta para destruir os alicerces de problemas estruturais que se arrastam desde o período colonial é ainda mais árdua. O abismo social que separa negros e brancos desde o nascimento no Brasil foi exposto em números pelo IBGE. Segundo o estudo Desigualdades Sociais por Cor e Raça no Brasil, divulgado em 2019, pretos ou pardos somavam 64,2% da população desocupada e 66,1% da população subutilizada; tinham rendimento médio pouco superior à metade do que recebem os brancos; e quase 2,7 vezes mais chances de serem vítimas de homicídio intencional do que uma pessoa branca. 

A falta de igualdade na representação política é outra faceta do racismo estrutural.  Das 1.626 vagas em disputa para cargos legislativos em 2018, apenas 444 eleitos eram autodeclarados negros (pretos e pardos), de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os números mostram um ligeiro aumento em comparação a 2014, quando 389 negros foram eleitos no Brasil para deputados distritais, estaduais, federais e senador, um índice de 24,3% das pessoas que se candidataram. Em 2018, o índice chegou a 27,3%, o que ainda evidencia um descompasso em relação aos dados oficiais do IBGE. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – Contínua (Pnad Contínua) daquele ano, a população negra correspondia a 56% do total de brasileiros.

No documentário Quem me Representa?, da TV Senado, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) aponta que a maior parte da população não se vê representada nos espaços de poder. 

Entre as medidas aprovadas pelo Senado para tentar aumentar a representatividade destaca-se a Emenda Constitucional 111, que conta com um dispositivo para incentivar candidaturas de mulheres e pessoas negras. Analisada em setembro, a PEC 28/2021, que deu origem à norma, foi relatada pela senadora Simone Tebet (MDB-MS). O texto determina que os votos dados a mulheres e pessoas negras serão contados em dobro para efeito da distribuição dos recursos dos fundos partidário e eleitoral nas eleições de 2022 a 2030. 

Confira lista de municípios que aderiram ao feriado de 20 de novembro

A data é feriado em mais de mil cidades brasileiras. A lei que regulamenta a data pode ser conferida no levantamento da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir). No estado de São Paulo, 102 munícipios aderiram ao feriado. Marília, para variar, não consta na relação.

Veja a lista de cidades:

– Aguai
– Águas Da Prata
– Águas De São Pedro
– Altinópolis
– Americana
– Americo Brasiliense
– Amparo
– Aparecida
 Araçatuba
– Aracoiaba da Serra
– Araraquara
– Araras
– Bananal
– Barretos
– Barueri
– Bofete
– Borborema
– Buritama
– Cabreuva
– Cajeira
– Cajobi
– Campinas
– Campos do Jordão
– Canas
– Capivari
– Caraguatatuba
– Carapicuíba
– Charqueada
– Chavantes
– Cordeirópolis
– Cruz das Almas
– Diadema
– Embu
– Embu Das Artes
– Estância De Atibaia
– Florida Paulista
– Franca
– Franco Da Rocha
– Francisco Morato
– Franco da Rocha
– Getulina
– Guaira
– Guarujá
– Guarulhos
– Hortolândia
– Ilhabela
– Itanhaem
– Itapecerica da Serra
– Itapeva
– Itapevi
– Itararé
– Itatiba
– Itu
– Ituverava
– Jaguariuna
– Jambeiro
– Jandira
– Jarinu
 Jaú
– Jundiaí
– Juquitiba
– Lajes
– Leme
– Limeira
– Mauá
– Mococa
– Paraiso
– Paulo de Faria
– Pedreira
– Pedro de Toledo
– Pereira Barreto
– Peruíbe
– Piracicaba
– Pirapora do Bom Jesus
– Porto Feliz
– Ribeirão Pires
– Rincão
– Rio Claro
– Rio Grande Da Serra
– Salesópolis
– Salto
– Santa Albertina
– Santa Isabel
– Santa Rosa de Viterbo
– Santo André
– Santos
– São Bernardo do Campo
– São Caetano do Sul
– São João Da Boa Vista
– São Paulo
– São Vicente
– Sete Barras
Sorocaba
– Sumaré
– Suzano
– Votorantim.

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