A Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) registrou nas 48 horas posteriores ao ataque à Escola Estadual Thomazia Montoro, no bairro Vila Sônia, na capital paulista, sete boletins de ocorrência com planos de adolescentes que pretendiam realizar atentados semelhantes em ambiente escolar. A suspeita da secretaria é que a ampla divulgação pelos veículos de comunicação e redes sociais da ação na escola Montoro tenha causado um efeito “contágio”, e motivado outros alunos a repetir o ataque.

Dentro deste quadro que estaremos elencando logo a seguir, por incrível que pareça, Marília passa a estar incluída. No balanço das ocorrências registradas nas últimas 24 horas, para a nossa surpresa e preocupação, uma escola estadual localizada no bairro Nova Marília, zona sul da cidade por muito pouco não foi palco de mais uma triste notícia a ser estampada não só neste portal, mas na maioria dos veículos de comunicação do Brasil.

Segundo o histórico da ocorrência, policiais foram acionados para comparecer nas dependências da E.E Sylvia Ribeiro de Carvalho, na rua Nair Rosilho Gutierrez, no bairro Nova Marília, pois graças a intervenção de uma supervisora, um atentado e outra tragédia de repercussão negativa teria sido evitada.

No descritivo, uma menor de 13 anos teria sido surpreendida pela supervisora no pátio da escola de posse de uma tesoura pontiaguda. Logo depois de imobilizada e apreendida a tesoura de suas mãos, ela teria sido levada até a diretoria da escola onde acabou confessando que a intenção era furar uma outra garota de 12 anos. Ocorrência registrada por volta das 11H30 da manhã de ontem, quinta-feira (30).

A garota que seria vítima ao ser abordada, relatou que as ameaças estavam ocorrendo a cerca de uma semana, mas ela não esperava que tomaria estas proporções. A menor foi encaminhada até a CPJ (Central de Polícia Judiciária), onde foi lavrado o boletim de ocorrência para apurar os fatos. Até a publicação desta matéria não havia nenhuma nota da secretaria estadual de educação de Marília, sobre o caso. Por envolver menores, a policia não pode oferecer maiores detalhes.

Outros casos

De acordo com a SSP-SP, entre os casos registrados após o atentado na escola da Vila Sônia, está o de um adolescente do 9º ano do Ensino Fundamental de um colégio da capital paulista que foi armado à instituição de ensino. A ocorrência chegou à polícia via Disque Denúncia.

Em Itapecerica da Serra (SP), uma mãe relatou que o filho foi ameaçado por outro estudante em uma escola. O adolescente teria feito promessas de um ataque similar ao da Vila Sônia. Na mesma cidade, policiais militares foram informados de que um aluno estava próximo da escola com uma arma. Ele foi encontrado com amigos, confirmou que a arma estava com ele e, em seguida, exibiu um simulacro.

Em Santo André (SP), um aluno ameaçou a professora durante a aula dizendo que os professores deveriam ser esfaqueados, como o caso da professora da escola da Vila Sônia, e que ele faria o mesmo, no dia seguinte.

Na mesma cidade, o coordenador de uma escola não autorizou a entrada de um estudante pela suspeita de ele estar armado. Dias antes o aluno havia brigado com outro colega e dito que iria matá-lo. Foi constatado que a arma se tratava de um simulacro.

Também em Santo André, uma criança de 11 anos foi encontrada portando um simulacro de arma de fogo no interior da escola.

Em São Bernardo do Campo (SP), policiais militares foram informados pela vice-diretora da escola de que havia um aluno portando pequeno punhal em sala de aula. Ele foi abordado e disse ter levado o artefato para mostrar aos colegas, sem ter ameaçado ninguém, mas relatou que vinha sofrendo ofensas homofóbicas e que tinha adquirido o punhal para se sentir mais seguro.

Um adolescente que planejava um atentado contra uma escola do Rio de Janeiro teve a internação provisória determinada pela Justiça na semana passada. O caso, porém, só veio à tona na terça-feira 28 com informações obtidas pelo jornal Folha de S. Paulo.

De acordo com a publicação, o jovem planejava atirar contra colegas de escola no Rio de Janeiro no dia 20 de abril, data em que o massacre de Columbine, nos Estados Unidos, completa 24 anos. O nome do colégio que era alvo do adolescente não foi revelada.

Inspiração

São Paulo (SP), 28/03/2023 – Alunos da escola estadual Thomazia Montoro e secundaristas do movimento estudantil prestam homenagens às vítimas do ataque, na porta da escola, em Vila Sônia. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Segundo a jornalista, editora pública e de conteúdo da Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca), Marta Avancini, a grande visibilidade dada nos meios de comunicação e redes sociais a um ataque, como o que ocorreu na Vila Sônia, pode estimular outros casos semelhantes. “Alguns estudos nos Estados Unidos, principalmente, que é onde esse tipo de fenômeno é comum, mais recorrente, mostra que para cada ataque à escola são desencadeados outros três”, destaca.

“Em grande parte isso acontece por conta da visibilidade que esses casos acabam tendo. Existe um fenômeno chamado efeito contágio. A partir do momento que você divulga, que você traz muita visibilidade para essa situação, de uma determinada forma, você acaba estimulando casos semelhantes. Assim que a notícia começou a circular, a gente começou a ver, em vários veículos, vídeos do momento da agressão. Esse tipo de exibição é extremamente prejudicial”, acrescentou.

De acordo com Avancini, a exposição do adolescente agressor deve ser evitada porque, além de desrespeitar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), pode se tornar um troféu para ele. “Uma coisa que não é recomendada é a gente ficar colocando o nome, colocando a imagem do agressor. Porque a visibilidade que essa pessoa conquista pode ser usada como uma forma de vangloriar o autor, de valorizar o ato”.

Para o pesquisador e professor de Jornalismo da Universidade de São Paulo (USP), Rodrigo Ratier, a cobertura jornalística do ataque à escola na Vila Sônia tendeu ao sensacionalismo e à busca desenfreada pela audiência.

“Acho que, mais uma vez, a cobertura ela tem buscado excessivamente à audiência. Eu acho que tem uma predileção pelo clique, pela matéria sensacional, resvalando no sensacionalismo. A literatura nos traz a ideia de que o debate sobre esse tipo de massacre, na verdade, pode originar outros massacres. Eu temo que a cobertura, nos moldes em que ela tá sendo feita, possa alimentar o efeito contágio”.

De acordo com o pesquisador, o próprio comportamento do jovem agressor pode evidenciar a tese do efeito contágio, causado pela divulgação excessiva do atentado ocorrido em 2019 em Suzano (SP), quando dois adolescentes mataram cinco estudantes e dois funcionários da escola Raul Brasil.

“O próprio atirador se posicionava na internet utilizando um apelido que, na realidade, era o sobrenome de um dos autores do massacre da Escola Raul Brasil, em Suzano. No próprio caso dele, a gente tem algumas evidências para achar que possa ter acontecido esse efeito contágio”.

Ratier ressalta ainda que a exposição massiva das cenas do massacre pode também aprofundar a dor das vítimas. “Esse número excessivo de detalhes sobre o crime, essa repetição, pode favorecer o efeito contágio, além de, evidentemente, reinstalar e aprofundar esse trauma naqueles que foram diretamente atingidos”.

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