Pix será ‘pavimento’ para tokens da moeda nacional; sistemas funcionarão em conjunto

O Real Digital está em fase de teste pelo Banco Central. A autoridade testa a versão da moeda brasileira em token apenas para instituições financeiras, por enquanto. Mas resta a dúvida: como o Real Digital vai funcionar com o PIX, que já é presente nas transações do dia a dia de milhões de brasileiros há quase três anos?

Ao mesmo tempo em que o Pix se tornou o meio de pagamento mais utilizado no país, ele deixa algumas lacunas a serem preenchidas pelo Real Digital. Os dois não tem a mesma função, apesar de possuírem um objetivo comum: digitalizar a economia brasileira. E o Pix pode ser a “gasolina aditivada” que o Real Digital precisa.

Qual a diferença entre o Pix e o Real Digital?

O Real Digital vai funcionar como uma extensão da moeda em papel que é negociada no dia a dia. Especialistas afirmam que, na verdade, será um token, ou seja, uma versão da moeda soberana nacional negociável apenas entre sistemas, mas lastreada ao real e às cotações internacionais.

O Pix, por outro lado, é um sistema de pagamentos digital e instantâneo que funciona no modelo peer to peer, de uma rede a outra. Portanto, não tem valor por si só, é apenas um método digital de transferência, tal como o TED ou DOC, usado pelos bancos.

Além disso, enquanto qualquer pessoa física ou jurídica pode transferir valores pelo Pix, o Real Digital vai ser emitido apenas pela autoridade monetária soberana no país. Ou seja, o BC.

O Real Digital faz parte da iniciativa do BC para criar uma CBDC (Moeda Digital de um Banco Central, na sigla em inglês). Outros países já criaram ativos parecidos, a exemplo da China, com o yuan chinês convertido para o yuan digital.

Para que serve o Real Digital?

Para Diego Perez, cofundador da SMU Investimentos e ex-presidente da ABFintechs (Associação Brasileira das Fintechs), o Pix vai funcionar como um “conduíte” do Real Digital. “Ele pode transacionar por meio do Pix, que deve ser um entre vários conduítes”, diz.

Ele explica que a intenção do primeiro projeto piloto do BC é transformar títulos públicos em tokens – especialmente as reservas do banco. Desta forma, o Banco Central ganharia liquidez nas transações de compra e venda de títulos da dívida brasileira.

Para o mercado financeiro, o Real Digital vai funcionar como um mecanismo de liquidez quase imediata de transações financeiras. Da mesma forma que o Pix age sobre pagamentos.

“O Real Digital vai tornar essas transações mais rápidas por causa dos instrumentos de liquidação do Banco Central. E também vai fazer com que esse tipo de operação aconteça de maneira instantânea ou em questão de horas ao invés de durar dias”, diz Perez.

Além das funcionalidades para as empresas, o Real Digital pode facilitar o depósito de salários e políticas de cashback entre bancos e consumidores. O estorno de impostos planejado pela reforma tributária também pode aproveitar o real tokenizado.

Economistas do FMI concordam que o Real Digital também pode agilizar transferências e, sobretudo, diminuir os custos de remessas entre instituições financeiras.

Em um artigo divulgado na última quinta-feira (3), os economistas Dmitry Vasilyev, Rina Bhattacharya e Mauricio Villafuerte listam o Brasil como um destaque no progresso para implementar ativos digitais na América Latina.

De acordo com uma pesquisa do FMI, mais da metade dos agentes financeiros da América Latina e do Caribe pretende instituir o CDBC não apenas para o mercado financeiro, mas também no varejo.

Mas, a princípio, o BC não desenvolveu soluções para pessoas físicas no projeto piloto, que contempla apenas empresas de finanças ou tecnologia. “Por enquanto, neste primeiro teste-piloto, não estão sendo contempladas opções para a movimentação pela pessoa física. Elas estão mais voltadas para grande lotes de liquidação financeira. É o sistema do Delivery versus Payment (mecanismo que torna transações seguras).”

Como o Real Digital vai funcionar com o Pix?

Na realidade, a visão dos especialistas é que o BC vem criando um ecossistema favorável para a implementação do Real Digital. Tanto o Pix como o Open Banking, que permite o compartilhamento de informações de clientes sobre crédito, contas correntes e investimentos, são parte deste combo.

A sinergia com o Pix virá por meio do que a head de Tokenização e Regulação da Foxbit, Nathaly Diniz, chama de “contratos inteligentes”. São programas que executam normas financeiras previstas em acordos estabelecidos entre duas empresas.

Pix não será substituído pelo Real Digital, dizem especialistas

Para Nathaly, o Real Digital tem o potencial de “revolucionar pagamentos”, otimizando serviços financeiros que o Pix é incapaz de agilizar.

“Um não vai substituir o outro.”Diego Perez, cofundador da SMU Investimentos

Conforme apontamentos de Perez, o Pix vai funcionar como um “pavimento para que o Real Digital possa correr” pela disponibilização ampla e fácil acesso do meio de pagamento a usuários comuns. O especialista afirma que “nada vai mudar” no acesso e transação do Real Digital em relação ao que já ocorre hoje com o Pix.

“Para acessar o Pix, você precisa ter relacionamento com instituição financeira. Quando Real Digital estiver disponível, nada muda. O usuário vai continuar acessando o banco para iniciar a transação de recursos”, diz.

“O que vai mudar será a representação gráfica do recurso transferido, que será digital e não analógica. E a liquidação financeira deve ficar muito menos suscetível a erros, já que não teremos mais o fator humano para modificar lançamentos”, conclui.

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