Uma das mais importantes profissionais da história da comunicação faleceu aos 73 anos, no RJ, e deixa um legado de inspiração, força e revolução
Na manhã desta quinta-feira (02), a jornalista Glória Maria morreu no Rio de Janeiro (RJ). “É com muita tristeza que anunciamos a morte de nossa colega, a jornalista Glória Maria”, informou a TV Globo em nota.
“Em 2019, Glória foi diagnosticada com um câncer de pulmão, tratado com sucesso com imunoterapia. Sofreu metástase no cérebro, tratada em cirurgia, também com êxito inicialmente”, continua o texto da emissora.
“Em meados do ano passado, Glória Maria começou uma nova fase do tratamento para combater novas metástases cerebrais que, infelizmente, deixou de fazer efeito nos últimos dias, e Glória morreu esta manhã, no Hospital Copa Star, na Zona Sul do Rio”.
Ela foi a primeira repórter a entrar ao vivo – e em cores – no Jornal Nacional. Fez história no jornalismo e na televisão, protagonizando momentos históricos.
Glória Maria deixa duas filhas, Maria e Laura. Afastada do Globo Repórter há mais de 3 meses, ela estava internada tratando um câncer. O último programa apresentado por ela foi a edição do dia 5 de agosto de 2022. Ela trabalhava no Globo Repórter há 12 anos.
Quem foi Glória Maria?
Talvez você mais novo conheça a figura de vídeos divertidos que viraram memes na internet, como aquele em que a repórter anda em uma montanha-russa na Jamaica. Mas a trajetória e a importância de Glória vai muito além!
Nascida no dia 15 de agosto de 1949, na Vila Isabel, no Rio de Janeiro, Glória Maria Matta da Silva era filha de Edna Alves Matta, uma dona de casa, e Cosme Braga da Silva, um alfaiate.
A carioca estudou em colégios públicos – onde aprendeu inglês, francês e latim – até o início da vida adulta, quando cursou Jornalismo na PUC-Rio. Para pagar os estudos, trabalhou como telefonista.
Seu primeiro estágio foi como radioescuta na Globo. Ela ouvia as frequências policiais para descobrir os furos de reportagem na cidade. Além disso, ocasionalmente, também ligava para as delegacias, para fazer o trabalho de apuração.
Mais tarde, Glória fez sua estreia como repórter, em 1971. Ele cobriu o desabamento do Elevado Paulo de Frontin – mas ainda não apareceu no vídeo, pois não era de costume.
Foi no Jornal Nacional, em 1977, que ela fez a sua primeira aparição em uma matéria, entrando para a história do jornalismo brasileiro como sendo a primeira repórter a fazer uma entrada ao vivo e em cores no programa de notícias. Na ocasião, ela cobria a movimentação das estradas pré-final de semana.
Em 1986, Glória Maria passou a integrar a equipe do Fantástico e permaneceu na casa até 2007. Foi no programa dominical que a repórter começou a explodir com suas icônicas matérias de viagem e entrevistas com famosos como Leonardo DiCaprio, Madonna e Michael Jackson. Até o Freddie Mercury ela entrevistou!
Entre outros marcos da carreira, a jornalista cobriu a guerra das Malvinas (1982) e a Copa do Mundo na França (1998). Em 2007, entrou de novo para a história ao participar da primeira transmissão em HD da televisão brasileira, no Fantástico, durante reportagem no Alto Xingu. Ela também realizou uma volta ao mundo, transmitida pelo Globo Repórter.
A voz do jornalismo negro
Glória Maria foi uma das primeiras repórteres negras a ter destaque na TV, em uma época em que negros eram ainda mais estereotipados e marginalizados, fazendo pontas como empregados e escravos em novelas. O jornalismo televisivo era formado majoritariamente por homens brancos de meia-idade. A profissional abriu portas e inspirou muitos estudantes a seguirem o caminho da comunicação.
A trajetória de sucesso, contudo, foi marcada por episódios de racismo, que a profissional relembrou em 2022, durante o programa Roda Viva, da TV Cultura: “Nada blinda uma mulher preta do racismo, nem mesmo a fama”, disse.
A mãe da Maria e da Laura
Em uma sociedade que cobra o tempo todo para que mulheres se tornem mães, Glória Maria sempre deixou claro que não sentia vontade de viver a maternidade – o que, por si só, já é uma fala revolucionária.
Durante uma viagem para Salvador, entretanto, a jornalista conheceu Maria e Laura, que viviam em um orfanato: “Eu nunca tinha pensado em ter filhos até que vi as duas pela primeira vez e tive certeza que elas eram minhas filhas. Isso é uma coisa que não sei explicar”, disse em entrevista ao jornal O Globo.
A adoção foi concluída em 2009 e Glória mudou-se na ocasião para a Bahia, para conseguir realizar todas as burocracias do processo. Também em entrevista ao O Globo, Glória mostrou toda sua potência como mulher negra, profissional e mãe: “Minhas filhas não têm pai, eu decidi tê-las sozinha. Sou eu e ponto(…) Eu odeio drama, não sou coitadinha. Vim sem esse sentimento. Nasci numa família extremamente pobre e matriarcal. Cheia de mulheres fortes. Minha avó Alzira, que morreu com 104 anos, tinha uma porrada de filhos, mandava em todo mundo”.
Como bem disse Maria Bethânia, em postagem em homenagem a uma das maiores profissionais da comunicação do Brasil (quiçá do mundo): “A Glória da vida. Um ícone da TV brasileira. Uma percursora do jornalismo ao vivo na TV. Uma doce pessoa”.
À Glória, a glória eterna!
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