Reduflação, fenômeno em que a indústria reduz a quantidade — “e às vezes a qualidade” — do produto para não aumentar o preço, tem se intensificado. A questão é que, os preços dispararam.
Quem aí é dos tempos em que as barras de chocolate tinham quatro colunas? Se você vai ao mercado com certa frequência, deve ter reparado que diversos produtos tiveram seus tamanhos reduzidos. Barras de chocolate que tinham 110 gramas agora têm 80. Outras foram de 120 para 90. E suas fileiras não têm mais quatro e sim três quadradinhos. Esse fenômeno se chama “reduflação”. Basicamente, para não aumentar o preço, as marcas diminuem a quantidade e, em alguns casos, até a qualidade dos itens. Mas, se você consumidor(a) guardou a notinha de meses anteriores, acabará constatando que mesmo assim, houve reajustes.
Com uma rápida pesquisa no Twitter, é possível encontrar consumidores insatisfeitos com as mudanças que têm encontrado nas prateleiras dos supermercados. As reclamações passam por leite condensado, que virou “mistura láctea”; manteiga, que passou a ser uma combinação de manteiga e margarina; e reduções de tamanho. A “dúzia” de ovos que agora vem com 10 unidades e a bandeja de frango tem menos de 1 quilo.
Um monte de alimentos que a gente come estão mudando e piorando a qualidade, prestem atenção
- leite condensado virou mistura láctea condensada de leite, soro de leite e amido
- chocolate virou sabor/aroma de chocolate
- leite virou composto lácteo
E compramos pelo mesmo preço…
Tenho me irritado muito com isso. Embalagens de peito de frango de 800g.
- Caixa de sabão em pó de 800g.
- Tudo ao módico preço de 1kg
Sem ter a quem recorrer.
Uma pesquisa do Instituto Reclame Aqui mapeou que 80% dos consumidores já perceberam que diversos produtos que eles buscam no mercado estão com tamanho ou qualidade reduzidos. Quase metade dessas pessoas afirma que começaram a notar as mudanças de um ano para cá, o que coincide com um período de alta da inflação.
A reduflação é legalizada? — Mudar o tamanho ou a embalagem de produtos não é ilegal desde que isso seja devidamente sinalizado. Qualquer mudança em peso ou quantidade de produto deve aparecer na embalagem, com letras maiúsculas, em negrito, com cores que contrastem com o fundo e em tamanho de fácil visualização, conforme determinação do Ministério da Justiça (portaria 81, de 23 de janeiro de 2002) e do Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1990). O Ministério da Justiça atualizou as regras (portaria 392, de 29 de setembro de 2021) e passou a determinar que as alterações fiquem expostas na embalagem por pelo menos seis meses, a partir da alteração de peso ou tamanho.
O fato é que sendo legalizada ou não, a reduflação tem afetado a decisão dos consumidores: 63% deles desiste da compra quando percebe as mudanças, de acordo com o Instituto Reclame Aqui. Por outro lado, a inflação derrubou o poder de compra de 90% das profissões brasileiras, segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), ou seja, a maioria dos trabalhadores não teve reajustes salariais que acompanhassem a alta inflação acumulada no período. A justificativa das empresas é que reduzem o tamanho dos produtos justamente para não aumentarem os preços e impactarem ainda mais o poder de compra dessas pessoas.
Inflação ‘disfarçada’ — Há quem diga que o fenômeno é uma “inflação disfarçada”, já que o consumidor vai pagar o mesmo preço, por uma quantidade menor ou por uma qualidade inferior de produto. Em muitos casos, o preço sobe de qualquer forma, um tempo após a alteração. Como já foi dito, a inflação impacta diretamente nesse cenário, principalmente pelo fato de setores como alimentação e bebidas, transportes e saúde e cuidados pessoais estarem entre os que mais acumularam alta nos últimos meses.
De acordo com o Instituto Reclame Aqui, os consumidores têm percebido as alterações, principalmente, nos artigos de limpeza e de higiene pessoal, e também nos biscoitos e lanches. Ao mesmo tempo, a farinha de trigo, que é um ingrediente presente na maioria desses biscoitos e lanches, acumula uma inflação de quase 30% nos últimos 12 meses, segundo o IBGE.
COMO LIDAR COM A REDUFLAÇÃO
Enquanto o cenário econômico do Brasil e do mundo estiver complicado, com a inflação nas alturas, esse tipo de prática deve continuar ocorrendo. Nós separamos algumas dicas que podem ajudar a contornar os impactos da reduflação no bolso do consumidor, na medida do possível
- Preste atenção aos tamanhos dos produtos: quando estamos no supermercado, vamos pegando os produtos da nossa lista muitas vezes sem reparar na quantidade que há nas embalagens. Essa prática nos leva a não perceber quando um produto tem seu tamanho reduzido, além de acabarmos não pensando muito se o preço está condizente com a quantidade. Então, atente-se ao peso e ao volume antes de colocar o item no seu carrinho.
- Tenha a mente aberta para outras marcas: se o produto da marca que você sempre compra não vale mais a pena, lembre-se que existem outras opções no mercado. Com os preços tão altos, vale testar alternativas. Geralmente, as marcas próprias dos supermercados têm preços mais atrativos, por exemplo.
- Atenção aos rótulos: além das mudanças de tamanho, as prateleiras estão cheias de produtos com as mensagens “nova receita” ou “nova fórmula”. Considerando que a maioria dessas alterações têm o objetivo de manter os preços, vale conferir o rótulo, principalmente na parte de ingredientes e na tabela nutricional, no caso dos alimentos. Além disso, alguns produtos de limpeza, por exemplo, estão rendendo menos usos e essa informação costuma estar em algum cantinho no rótulo.
- Em caso de irregularidades, denuncie: qualquer mudança de quantidade e fórmula do produto ou tamanho de embalagem deve estar sinalizada de forma clara no rótulo. Se você identificar alguma alteração não informada ao consumidor, denuncie ao Procon do seu Estado.
JUSTIFICATIVA: Dificuldade de acesso a insumos afeta 22 entre 25 setores da indústria, comprometendo a qualidade.
A guerra na Ucrânia e os lockdowns em regiões industriais da China estão prolongando um problema que começou com a pandemia de covid-19, em 2020. A escassez ou o encarecimento de insumos afeta 22 de 25 setores da indústria, revela levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Segundo a CNI, há oito trimestres seguidos as indústrias citam a dificuldade de acesso a matérias-primas como o principal problema. No segundo trimestre deste ano, o setor mais afetado foi o das indústrias de impressão e reprodução, com 71,7% das empresas citando o problema. Em seguida, vêm os setores de limpeza, perfumaria e higiene pessoal (70%) e indústrias de veículos automotores (69,8%).
Apenas três segmentos da indústria não mencionaram a falta ou os preços altos das matérias-primas como o principal problema. Entre as indústrias de couros e artefatos de couro o problema apareceu em terceiro lugar, citado por 37,2% das empresas entrevistadas. Nos segmentos de móveis (38,7%) e de manutenção e reparação (45,5%), o problema ficou em segundo lugar na lista.
Para a economista da CNI, Paula Verlangeiro, cerca de metade da produção industrial é consumida como insumo pela própria indústria. Dessa forma, a escassez ou os preços altos dos insumos não atingem apenas os fabricantes e se disseminam pela cadeia produtiva, atingindo o consumidor por meio de aumento de preços ou de queda na produção.
A última sondagem industrial divulgada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em outubro de 2022 apontou que a falta ou alto custo de matérias-primas ainda é a maior preocupação no setor industrial brasileiro.
Segundo o levantamento, o aumento dos custos de insumos e matérias-primas nacionais superou as expectativas de 71% das empresas, na indústria extrativa e de transformação, e de 73% no caso específico da indústria da construção civil.
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