Olá pessoal, estamos de volta e, nesta edição vamos quebrar o protocolo das viagens via ônibus para se deliciar pelas paisagens dos trilhos. Para o sucessor desta matéria que vamos publicar em duas ou três edições, percorremos cinco ferrovias para passageiros no Brasil.

Foi uma viagem por uma profusão de histórias, rostos, paisagens. Foi Brasil na veia. Trem de longa distância, trem diário, trem de fim de semana. Trem
que passa por estradas de ferro centenárias, serpenteia a Serra do
Mar, corre por planícies pantaneiras, contorna pedaços raros de Mata
Atlântica nativa. Tem trem pra todo mundo – e não estamos falando
de Europa.


Ainda que a malha ferroviária brasileira não seja lá para inglês ver,
temos quase 30 000 quilômetros de trilhos e estações que servem de
cenário para novelas de época. Pois a Viagem e Turismo decidiu fazer
um trem divertido: percorrer este Brasilzão através de suas ferrovias.


Escolhemos cinco trechos e passamos por quase todas as regiões do
país. Foram 1.689 quilômetros dentro de marias-fumaças, litorinas e
locomotivas diesel-elétricas. A epopeia, que começou em Minas
Gerais, na estação imperial de São João Del Rei, só terminou 12 dias
depois.


Fomos de São João a Tiradentes de locomotiva a vapor e de Belo
Horizonte a Vitória em vagões novíssimos. No Espírito Santo,
desfrutamos das Montanhas Capixabas. Encaramos também a
lendária Estrada de Ferro Carajás, entre o Maranhão e o Pará, por 16
longas horas, antes de fazer o famoso trecho de Curitiba a Morretes,
no Paraná.


Voltamos com histórias que mostram a exuberância natural e cultural
deste país acachapante, ainda mais delirante se visto sob outra
perspectiva. A dos trilhos.

De volta ao passado na maria-fumaça — São João Del
Rei → Tiradentes (MG)


Jovens aguardam ansiosos o apito da partida, senhoras acenam com
lenços para amores viajantes, moços veem das janelas suas
saudades virarem pequenos pontos no horizonte. Minas Gerais, que
carrega ouro, prata e minério de ferro nas veias, é a estrela das
estações centenárias do país, que por anos revelaram cenas como
essas.


Por causa de uma bitola (a distância entre os trilhos) de apenas 76
centímetros, a lendária Estrada de Ferro Oeste de Minas leva o
apelido de “Bitolinha”. No século 19, ela se estendia por 602
quilômetros até o litoral carioca.


Hoje só vai de São João Del Rei a Tiradentes (12 quilômetros), mas
segue causando auê entre os moradores, que correm para ver a
maria-fumaça passar.


Das cidades históricas mineiras, São João foi a que mais se expandiu.
Ela guarda um centro histórico conservado e igrejas esplendorosas (a
de São Francisco de Assis ganha menção honrosa pela fachada com
palmeiras-imperiais).


Começar a viagem por São João (e não por Tiradentes) é a melhor
maneira de embarcar no passado, já que sua estação tem o Museu
Ferroviário, que volta às origens com litografias e objetos de
antigamente.


O maquinista Alexandre costuma lagartear por lá antes de botar o
trem nos trilhos. “Sabe como funciona uma panela de pressão?”, é o
jeito com que começa a explicar o mecanismo da locomotiva a vapor.


Já são dois séculos de invenção, mas ainda impressiona ver essa
gigante funcionar assim: à base de água e óleo. Países com tradição
ferroviária, como a Alemanha, já aposentaram suas marias-fumaças
há anos. Ou seja, elas são um tesouro.


Dada a largada, aparece a Edna, que vende memória afetiva em
forma de doce – pirulito de mel, pé de moleque e cocada com limão.
Ela é filha do Seu Zé do Ferro Velho, o doceiro mais antigo de São
João.


Lá fora, o verde da mata divide espaço com o amarelo-manga dos
ipês (primavera!), e uma brisa boa entra pela janela de guilhotina. O
auge é quando avistamos o Rio das Mortes, o córrego dos injuriados
da Guerra dos Emboabas, que corre translúcido na frente dos blocos
de pedra da Serra de São José.


E quando a viagem começa a dar um caldo… Fóóón. Chegamos. A
brincadeira acaba em 37 minutos. Antes de decidir se você quer
chegar ao miolo de Tiradentes a pé (a 1,5 quilômetro) ou de charrete,
assista aos funcionários puxarem, manualmente, a frente do trem para
inverter a direção.


Coincidências à parte, o episódio atraiu os celulares de uma turma da
escola “Piuí Cha Chá”. E o desembarque na hora do almoço é
providencial para conjugar o tour com qualquer coisa que venha de
um fogão a lenha. Trem bom demais.

Extensão: 12 km (40 minutos de viagem).
Estações: duas (São João Del Rei e Tiradentes).
Partidas: de São João: 6ªs 10h, 14h; sáb 10h, 13h30 e 15h30; e
dom 10h e 13h30. De Tiradentes: 6ªs 11h30, 16h; sáb 11h, 14h30
e 16h30; e dom 11h e 14h30.


Onde comprar: nas bilheterias das estações ou nas agências de
turismo.


Fica a dica: pode lotar aos sábados, especialmente durante as
férias escolares e em épocas de festivais em Tiradentes (como o
de cinema, no fim de janeiro, ou o de gastronomia, em agosto).
Melhor lado do vagão: esquerdo (sentido São João –
Tiradentes). Dá visões mais amplas da imensidão e cai de frente
para os paredões da Serra de São José nos instantes finais.

Você gostou ??? Então não perca a nossa próxima edição impressa ou nos acompanhe pelo SITE e pelas redes sociais onde publicaremos a continuação do passeio pela Rota clássica, trens modernizados — Belo Horizonte (MG) → Vitória (ES), e descobrir o segredo das montanhas capixabas – Viana → Araguaia (ES).

Cristina de Lucchi é Jornalista e Apresentadora. Atua no JORNAL DO ÔNIBUS de MARÍLIA como colaboradora comentando sobre turismo em geral em sua coluna.

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