Sem nenhum sorteio de leiloeiros em 2019, o Detran-SP (Departamento Estadual de Trânsito) deve ampliar um velho problema nos pátios de apreensão sob sua responsabilidade: a superlotação. É a ponta de uma série de transtornos, já que, enquanto o martelo não é batido, as dívidas e os custos só aumentam para donos de veículos e administradores de pátios.

O tema repercute no setor. Empresários procuraram a Appagesp (Associação de Pátios e Guinchos do Estado de São Paulo) durante toda a semana, relatando dificuldades em pelo menos 90% dos pátios do Estado, com intensificação da crise nos próximos meses.

Em algumas regiões, sem leilões, há risco de demissões de funcionários e falta de recursos para manter a segurança (eletrônica e vigilância pessoal) da frota recolhida.

Durante reunião nesta sexta-feira (26), em Santa Cruz do Rio Pardo, a inércia do Detran-SP em definir o modelo de leilões foi um dos temas. Fontes ouvidas pela reportagem afirmam que os editais que já estão publicados são resultado de sorteios do ano passado, ou seja, sem novas definições de leiloeiros, o próximo semestre tende a ser caótico.

O QUE DIZ A LEI?

O artigo 328 do CTB (Código de Trânsito Brasileiro), que trata dos leilões, autoriza a destinação do veículo apreendido e não reclamado a partir de 60 dias, porém o texto está entre os mais “emendados” da legislação federal e depende de leis estaduais para sua efetiva aplicação.

Em São Paulo está em vigor a lei “Via Rápida”, que a partir de 2015 melhorou a eficiência e deu maior fluxo nos depósitos. O problema, relatam donos de pátios, é que desde o início da atual gestão do Detran paulista, foi criado um verdadeiro nó para a escolha de leiloeiros.

A situação no Estado foi comunicada a Abralei (Associação Brasileira de Leiloeiros), que em nota manifestou-se sobre a indefinição. A entidade admitiu que tanto o contribuinte, que precisa pagar suas dívidas e reaver parte de seu bem, quanto os investidores do setor, estão ameaçados.

“Existe uma portaria (938/2006) publicada pelo Detran-SP e vigente que estabelece sorteio para definição de leiloeiro, entre os credenciados pelo Departamento de Trânsito. A nova gestão do órgão, pelo que fomos informados, questiona esse sistema de sorteios e quer distribuição equitativa”, disse em nota a associação que representa os leiloeiros.

A entidade não declara preferência por um, nem por outro método, mas pede que haja diálogo, critérios técnicos (observância da qualidade e expertise do leiloeiro escolhido) e transparência para a retomada dos leilões.

SUPER FROTA

Segundo estimativas da Apagesp, o Estado de São Paulo conta com mais de 400 pátios de veículos apreendidos, sob responsabilidade do Detran (permissionários ou licitados), onde existe uma frota de “algumas centenas de milhares de unidades”, entre carros motos e utilitários.

O trabalho do leiloeiro favorece, inclusive, que os órgãos de trânsito tenham conhecimento do número de veículos acumulados. Para saber quantos estão aptos a leilão, seja com condições de circular ou venda como sucata, o profissional leiloeiro faz o levantamento. Esse trabalho, porém, só começa com o sorteio e a publicação do edital.

INÉRCIA

A paralisia que atingiu o Detran-SP, em relação aos leilões, é semelhante ao que acontece em diversos órgãos públicos do país desde o início do ano. Com a mudança em vários governos e a expectativa de novas e diferentes práticas, técnicos experientes perderam espaço. Em alguns casos, o novo deu lugar ao nada, enquanto os problemas se acumulam.

Para o professor e especialista em Direito no Trânsito, Marcelo José Araújo, toda contestação tem que ser seguida de uma proposta. “Se eu estou contestando, eu tenho que saber porque estou contestando e qual é o outro caminho. Principalmente na administração pública”, alerta.

Ele afirma que no trânsito, por sua complexidade, a divergência é comum. “Se existe dúvida do caminho a ser tomado, é necessário fazer uma consulta à Procuradoria do Estado, no caso de um órgão público estadual. Se o órgão tem autonomia de gestão (autarquia), tem corpo jurídico próprio para que a direção possa legitimar seus atos. Do contrário, ocorre a inércia, que pode, inclusive, resultar em responsabilidade pessoal do administrador”, disse o advogado.

Com o impasse sobre a melhor maneira de indicar leiloeiro para cada certame, a frota recolhida só aumenta. Os efeitos, além dos prejuízos econômicas, passam pela perda da credibilidade de um sistema que promete ser ágil, mas que “fabrica sucata” e gera até risco de transmissão de doenças, como a dengue e outras transmitidas pelo Aedes Aegypti.

Colaboração e Fotos: Carlos Rodrigues ( Jornalista )

error: Conteúdo protegido por direitos autorais.